Jovens Preferem
Jornalismo Cultural na Web
A cultura faz parte do nosso dia a dia, e a importância do jornalismo cultural na realidade brasileira se difere de outros países no mundo. O Brasil um dos poucos, senão o único país com um caderno diário de cultura, algo que não é regra em outros lugares do mundo. Esse estilo começou em 1960, com a criação do famoso Caderno B do Jornal do Brasil. O caderno de cultura acompanhou as mudanças gráficas do periódico e deu uma nova roupagem e dimensão para a cobertura de cultura no país, um pioneiro.
O Caderno B até hoje é referência pelo seu estilo, mas hoje os jornais da grande mídia encontram maior resistência entre os jovens. Bruno Warth, estudante da UFRJ, não se sente tão representado pela cultura retratada no Globo e na Folha de S.Paulo, respectivamente o maior jornal do Rio e do país.
– As matérias acabam sempre falando dos mesmos personagens, que já estão no meio há muito tempo. Quando quero procurar por coisas novas, eu acabo usando sites mais alternativos.
O aluno de Comunicação Social da PUC-Rio Gabriel Franco tem uma opinião similar:
– Eu prefiro blogs porque eles são de nicho, um público mais específico. Volta e meia no Globo tem uma matéria sobre o Gil e o Caetano, de quem eu gosto muito, mas eles já estão aí há 50 anos. Nos blogs independentes se acaba falando deles, mas é dado mais espaço para quem está começando e não tem tanto destaque na grande imprensa.
As mudanças na grande mídia
Segundo Arthur Dapieve, colunista do Globo e estudioso do jornalismo cultural, o jornalismo de cultura sofreu duas mudanças importantes.
– Antigamente, as políticas de estado para cultura eram muito mais centrais. Hoje em dia, o papel da iniciativa privada e da iniciativa individual do próprio artista são maiores, e os jornais se preocupam menos em noticiar o que secretários e ministros da Cultura planejam fazer. O jornalismo no fim da década de 1980 e início da década de 1990 começa a falar para mais gente e ganha uma linguagem e conteúdo mais jovem.
Porém, hoje, o jornal O Globo tem mais de 60% dos leitores com mais de 40 anos, sendo que a parcela acima de 60 anos corresponde a 28% dos leitores. Esse público envelhecido acompanhou transformações significativas no modo de se cobrir a produção cultural.
Para o jornalista, ainda há uma terceira mudança, mais recente que as outras, que tornou a pauta dos cadernos de cultura mais ligada ao gosto médio do público.
– Isso não é necessariamente um fator positivo, já que há uma tentativa de se adular, eu diria, certos segmentos da sociedade tratando como excepcionais coisas que não são artisticamente importantes. Hoje em dia, na tentativa de conquistar mais leitores, os meios de comunicação começaram a ser um tanto condescendentes com certos produtos culturais, um sertanejo mais aguado, um funk mais aguado, porque o mais aguado fala para mais gente – afirma Dapieve, fazendo a ressalva de que não se refere à simples cobertura desses ritmos tidos como populares, mas sim ao modo como eles são produzidos.
Para ele, a questão nada tem a ver com o grau de erudição da cultura ou com a classe social da produção cultural:
– Baixa e alta cultura não se confundem automaticamente em termos de qualidade; não necessariamente o que é alta cultura é bom e o que é baixa cultura é ruim ou vice-versa. Muitas manifestações culturais de pessoas pobres acabaram soterradas por manifestações que não são feitas por pessoas pobres, mas falam para um público mais amplo.
É justamente essa busca dos jornais pelo público médio que fez o jovem Daniel Oliveira, estudante de Engenharia da UFRJ, procurar sites e blogs mais adaptados ao seu nicho.
– Como eu gosto muito de rap americano, tanto os mais famosos como aqueles que ainda estão começando por lá, eu prefiro ver sites menores que fazem resenhas e trazem notícias sobre alguns desses músicos, algo muito raro no Globo, o jornal que eu mais leio.
Os visitantes em números
Segundo a o site Infoglobo.com, o Segundo Caderno possui 485 mil leitores semanais, dos quais apenas 19% estão na faixa entre 10 e 29 anos. Já o site Tenho Mais Discos Que Amigos! teve, entre maio e outubro de 2015, um público médio de 246 mil pessoas por mês através do computador, sem contar acessos por dispositivos móveis. Desse grupo, 37% dos visitantes têm entre 18 e 24 anos, e mais de 44% dos acessos são feitos por pessoas entre 25 e 34 anos.

Arthur Dapieve: Camila Araújo
Por Gilberto Magalhães, Ivan Paiva
e Lucas Campelo
Fonte: SimilarWEB

Mais de 70% do público do site tem menos de 35 anos, sendo uma maioria considerável de homens.
Fonte: Site TMDQA!
Tony Aiex, criador e principal redator do Tenho Mais Discos Que Amigos!, contou um pouco mais sobre o nascimento do portal de notícias de música. “O TMDQA! começou em 2009 como um hobby. Em 2012 eu ainda não vivia de site e ganhava pouco ou quase nenhum dinheiro com o TMDQA!, mas o número de visitas crescia mês a mês e eu decidi que, se não arriscasse, nunca saberia se ele daria certo profissionalmente. Em 2013 comecei a viver dos rendimentos do site.”
Para Aiex, o TMDQA! não compete de forma direta com sites de cultura dos grandes jornais. Para ele, o conteúdo próprio do site é que o distancia dos concorrentes. “Talvez tenha competição entre o TMDQA! e as versões online desses cadernos, dos portais, etc. Mas ainda assim, além das notícias, apostamos em um conteúdo nosso sobre os mais diversos assuntos. Curadoria e conteúdo próprio são peças chave para o sucesso de um veículo, principalmente ao competir com mídias que estão aí há décadas.”
O site é um dos mais famosos quando se trata de música, mas apesar do sucesso tem uma equipe reduzida, algo comum nas redações tanto de sites como de jornais impressos. “A equipe varia em torno de 10 colaboradores. Eu escrevo cerca de 70% das matérias do site e o pessoal absorve o resto. A maioria é formada ou ainda está cursando jornalismo”, explica o produtor de conteúdo.
Segundo Aiex, escrever para uma mídia digital dá mais liberdade, mas é preciso saber aonde quer chegar com seu conteúdo. “Acredito que exista mais liberdade sim. A vantagem principal da internet é a rapidez com que se pode ter uma notícia quente do que esteja acontecendo pelo mundo. É uma questão de se adaptar e trilhar, por conta própria, os caminhos pelos quais quer chegar a um resultado que traduza como quer que as pessoas vejam o seu veículo.”
Outro site que chama atenção é o Omelete, que pertence ao UOL, mas tem um conteúdo próprio e que se difere do gigante portal. O Omelete, que já tem 15 anos de existência, já se consolidou como um portal de cultura para o brasileiro. Foram mais de 5,68 milhões de visitantes em média, entre maio e outubro de 2015. Segundo o site Similar Web, o portal ocupa a oitava posição entre os sites de arte e entretenimento que têm mais visitantes brasileiros na web. A posição ainda poderia ser melhor, já que o site está atrás de páginas de download de arquivos, que não oferecem conteúdo próprio (ver link).

Quantidade de acessos ao Omelete nos últimos seis meses.
Fonte: SimilarWEB
O estudante da PUC-Rio João Paulo Correa, de 21 anos, comenta que não só lê as críticas do site, mas também acompanha assiduamente o canal do YouTube.
– Eu sempre gostei de cultura nerd, principalmente cinema e videogames, então dois sites que eu acompanho muito são o Omelete e o Jovem Nerd. Eu gosto muito de ler as críticas deles e sempre escuto os podcasts do Jovem Nerd e vejo o Omelete TV no YouTube.
Em texto publicado no Observatório da Imprensa, a jornalista Mariana Ramos Pimentel, formada em Comunicação Social pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), defende que os jornalistas precisam fazer um jornalismo cultural de qualidade, que atinja todas as camadas da sociedade. Para ela, é preciso se desvencilhar da tentação do “copia e cola” da internet para produzir conteúdo diferenciado.
Leitor do El País Brasil, Kenzo Osanai, de 20 anos, concorda:
– Eu não leio muito a parte de cultura do Globo e quando quer saber algo sobre algum artista que me interesse acabo procurando informações nas páginas dele no Twitter e Facebook. Mas um dos sites que mais acesso e o El País, lá eu encontro vários críticos e jornalistas de cultura com os quais eu me identifico.