PODCASTS: ERA DE OURO NOS ESTADOS UNIDOS. E NO BRASIL?
Os podcasts, presentes na internet há cerca de dez anos, podem estar passando por um ressurgimento. Desde 2014, a mídia cresce com mais velocidade e conquista novos públicos. Um dos responsáveis pela nova visibilidade do podcast nos Estados Unidos e no mundo foi Serial, que faz jornalismo narrativo. Com um histórico no rádio, o gênero tem vários expoentes americanos. Aproveitando-se das capacidades do áudio e de mecanismos de storytelling, esses programas realizam uma abordagem acessível, porém, não superficial de um assunto ou história.
Em tempos de Netflix, Youtube e Spotify, faz sentido que o consumo de informação em áudio por demanda se torne mais popular. Um problema, porém, é o financiamento da produção desses conteúdos, em especial, os mais sofisticados, como os de jornalismo narrativo. Principalmente no Brasil. Onde, aliás, não há muito uso jornalístico de podcasts ainda. Iniciativas independentes começam a surgir agora por aqui. Enquanto isso, outras se desenvolvem nos EUA e, em um cenário mais maduro, buscam também soluções para certas dificuldades práticas. Em diferentes estágios, aqueles que estão investidos nessa mídia estão demonstrando possibilidades de inovação para o jornalismo.
É disso que trata o programa que você pode escutar a seguir, uma espécie de protopodcast (e, se escutar o áudio, vai entender por que hesitamos em chamar de podcast). Para ajudar a compreender o tema, foram entrevistados o jornalista Pedro Dória, colunista do jornal O Globo e especialista em tecnologia e mídia; Lucio Luiz, jornalista, pesquisador e produtor de podcasts; Ivan Mizanzuk, professor da PUC do Paraná e produtor de podcasts; Marco Aurélio Carvalho, jornalista e radialista da Rádio MEC; e Mia Lindgren, pesquisadora do assunto e chefe da Escola de Mídia, Filme e Jornalismo da Universidade Monash, na Austrália.
Por Isabela Cabral e Rafaela Dugin
Links do programa
Pesquisas e artigos mencionados:
The Infinite Dial 2015 - Edison Research
What’s Behind the Great Podcast Renaissance? - New York Magazine
The (Surprisingly Profitable) Rise of Podcasts Networks - Fast Company
The Future of Media is Podcasting - Fast Company
Podcasts mencionados:
Para saber mais:

Em ascensão, os podcasts são consumidos com regularidade por 10% da população norte-americana Foto: Reprodução

Sarah Koenig, responsável pelo podcast Serial, foi eleita uma das 100 pessoas mais influentes do mundo em 2015 pela revista Time Foto: Reprodução

O presidente americano Barack Obama grava com Marc Maron em sua garagem para o WTF Podcast Foto: Reprodução

Em ascensão, os podcasts são consumidos com regularidade por 10% da população norte-americana Foto: Reprodução
Os novos podcasts brasileiros de não-ficção com storytelling
O Projeto Humanos expõe narrativas pessoais e, a partir delas, realiza análises e reflexões sobre temas abrangentes. A maior parte da primeira temporada conta a história de Lili Jaffe, uma iugoslava judia que sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz e escreveu um diário sobre suas experiências. O programa inclui entrevistas dos personagens e de especialistas. Outro episódio fala do vazamento de fotos privadas de uma jovem de 20 anos.
A ideia do Vida Sonora é se aprofundar nas histórias por trás das coisas na busca por compreender melhor o mundo. Lugares, pessoas, objetos, ideias e anos poderão ser temas dos audiodocumentário, de acordo com o site do podcast. É um programa bem recente: só teve um episódio até agora, sobre as línguas e as interações entre os vários idiomas na sociedade contemporânea.
Produzido por um brasileiro que mora no Japão, esse podcast conta histórias de cidadãos, das culturas e das línguas dos dois países, especialmente quando se cruzam. A estrutura do Ninguém:人間 é composta por um misto de entrevistas e comentários do narrador. As pessoas que trocam cartas com presidiários e como esses usam os correios como porta de acesso ao mundo externo são o assunto do quinto episódio, por exemplo.

Ivan Mizanzuk é o criador do Projeto Humanos, novo podcast brasileiro em formato storytelling
"Estrutura de narrativa é, eu tô convencido, a chave do jornalismo no século XXI."
Pedro Dória
"Ter a possibilidade de ouvir uma boa reportagem em áudio enquanto faz uma outra atividade que não demande uma atenção plena é uma coisa positiva."
Lucio Luiz
"O áudio é mágico na cabeça das pessoas. O rádio, a linguagem auditiva, é o único meio de comunicação que entra por um sentido, a audição, e fabrica seis."
Marco Aurélio Carvalho
Como receber podcasts nos dispositivos móveis:
dicas de aplicativos
Para ouvir um podcast, você pode simplesmente dar play na página do programa, pode fazer o download do arquivo ou pode fazer uma assinatura por um aplicativo agregador de podcasts e recebê-lo no seu smartphone, iPod ou computador. O recursos desses aplicativos variam e alguns são mais sofisticados do que outros, mas a ideia principal é disponibilizar um catálogo de podcasts para que o usuário selecione os que desejar se inscreva. Assim, sempre que um novo episódio de um podcast assinado for lançado, por meio do sistema de feed RSS, ele vai ser automaticamente baixado ou oferecer essa opção. O ouvinte vai ter à sua disposição, para ouvir quando quiser, uma espécie de biblioteca de podcasts com o conteúdo personalizado. Conheça algumas das melhores alternativas de aplicativos.

Podcasts (nativo do iOS)
Overcast (iOS)
Pocket Casts (iOS, Android e Windows Phone)
WeCast (iOS e, em breve, Android)
Podcast Addict (Android)
PodStore (Android)
Aplicativos agregadores, como o Pocket Casts, facilitam o acesso aos podcasts
making of
Esse trabalho começa com a escolha da pauta, que foi motivada pela imensa afinidade da Isabela Cabral com o tema. Em uma espécie de tentativa de doutrinação, Isabela, desde o início do curso de Comunicação, vinha repetindo para mim, quase como um mantra, o quão interessante e importante é o consumo de áudio sob demanda.
Assim que a professora Itala propôs um trabalho a respeito da conjuntura do jornalismo, pensamos: por que não abordar o cenário do uso jornalístico do podcast no mundo e de que maneira isso pode chegar ao Brasil? Será que essa moda pega por aqui? Só tinha um problema nessa produção. A reportagem seria para o disciplina Laboratório de Jornalismo (Texto) do curso de Comunicação Social da PUC-Rio, e estávamos tratando de uma mídia em áudio. Aí coube à Itala embarcar nessa ideia. E não só embarcou como ousou: “Para fazer sentido, não quero só texto. Quero um podcast produzido por vocês”. Desafio lançado. Com receio pelas dificuldades de produzir um bom conteúdo, Isabela relutou, mas depois de muita insistência minha e da professora, cedeu.
Mas um problemão no caminho quase nos desmotivou. (E isso não é uma estratégia narrativa, tipo clímax, para te prender ao texto, daquelas citadas no nosso “podcast”. Não mesmo. Gostaríamos que fosse.) Tudo pronto para uma das entrevistas principais, com o jornalista Alexandre Maron. Até então nem tínhamos a certeza de que faríamos o programa em áudio. Quase duas horas de papo conduzidas de maneira brilhante por Isabela. Minutos depois do fim da conversa, fomos ouvir a gravação. Nada gravado. Nem uma palavra. O conteúdo teria que ser transcrito de cabeça. Ou então precisaríamos recorrer à mais lavada cara-de-pau e pedir ao entrevistado para regravar algumas partes por questões técnicas. Adivinha qual foi nosso recurso? A cara-de-pau. O único problema foi que não funcionou. As novas tentativas de contato deram em nada. Teríamos que nos contentar com as demais sonoras, ainda não gravadas. Desespero momentâneo. Coube a mim tentar acalmar a situação. Minha vez de repetir um mantra: “Relaxa, vai dar tudo certo!”
Uma semana depois, quando o sentimento de “como somos burras” passou, demos sequência à produção. Isabela entrou em contato com os demais entrevistados e a situação foi melhorando muito. Cada um mais bacana que o outro e com mais conteúdo que o outro. Aí foi fácil. Juntamos a aula dos especialistas, o conhecimento prévio da Isabela sobre o assunto e eu, praticamente leiga. Complemento perfeito, ou quase. Minha função era tornar o texto o mais didático possível. Se eu entendesse, estava ok. Se não, freava a repetição de termos já internalizados no âmago podcaster da Isabela. E dessa mistura saiu isso aí, que vocês podem ouvir e baixar nesta página. Um pequeno panorama sobre esse universo do áudio sobre demanda.
Por Rafaela Dugin

“Com licença, senhor, você tem um minuto para conversar sobre o último episódio de Serial?” - Charge publicada no jornal The New York Times